ALHURES

Núcleo Música Nova | vol. 3

“Imerso” (2020) de Cristina Dignart

“Natural Mutations” (2020) de Tania Rubio

“Outuno” (2020) de Clayton Rosa Mamedes

“grés de Furnas” (2020) de Felipe de Almeida Ribeiro

“Vida” (2020) de Patricia Martínez

“Crise de Sol” (2020) de Paulo Rios Filho

Difusão Sonora: Felipe de Almeida Ribeiro
Curadoria: Felipe de Almeida Ribeiro
Organização: Grupo de Pesquisa Núcleo Música Nova www.nucleomusicanova.com.br

Dia: 28.04.2023
Horário: 17h00
Local: USP / Sala 12, Cidade Universitária, São Paulo.

Alhures

Homenagem Póstuma à compositora argentina Patricia Martinez (1973-2022)


«(...) para que a arte tenha sucesso, seu criador deve falhar.»

Morton Feldman


A relação do ser humano com o meio ambiente possui um histórico emaranhado. Em um momento antropocêntrico e pandêmico, a natureza nos cobrou responsabilidades e posicionamentos de forma surpreendente e agressiva, tornando o ano de 2020 uma tormenta para todos – quiçá nosso futuro pós-pandemia seja fortemente redesenhado. Um vírus que está matando milhares – independente de classe social, etnia, sexo, ideologia –, aponta o quão grave e desgastada está a relação do ser humano com o meio ambiente. A guerra contra o vírus é emergencial, porém nos assusta saber que os maus-tratos com o meio ambiente têm se acentuado de forma exponencial nesses últimos anos, em especial no Brasil, com o constante desmatamento de florestas nativas, como a Amazônia, e a negligência das autoridades responsáveis e da própria sociedade civil.

É nessa atmosfera que nasce Alhures, projeto que conta com seis artistas latino-americanos – Patricia Martínez (Argentina), Clayton Mamedes, Cristina Dignart, Felipe de Almeida Ribeiro, Paulo Rios Filho (Brasil) e Tania Rubio (México) –, encorajados a buscar em sua arte:


• repensar o meio ambiente por meio do som e da arte contribuindo para uma conscientização;

• ressignificar a posição do sujeito artístico, contestando os inúmeros paradigmas da figura do compositor; • analisar nossa realidade local, desde o impacto industrial na qualidade de nossos alimentos até à negligência de instituições em crimes de impacto ambiental;

• por fim, refletir sobre o impacto do homem no planeta como um de seus principais agentes geopolíticos.


É em clima que mistura sentimentos de festividade pela edição deste álbum com as urgentes demandas do planeta, que nos despedimos com as perturbadoras – contudo inspiradoras – palavras de George Orwell na obra literária 1984: “Ainda nos encontraremos no lugar onde não há escuridão”.


Felipe de Almeida Ribeiro

01/01/2021 Itapoá, SC, Brasil

“Imerso” (2020) de Cristina Dignart

“Imerso” (2020) teve como fio condutor criativo os efeitos catastróficos que a ação humana pode causar no planeta e consequentemente em outros humanos. As tragédias ocorrida em Minas Gerais em Mariana e Brumadinho são os contextos que servem de referência para simbolizar os efeitos que podem ser desastrosos da interferência do homem na natureza. Ambos casos provocaram consequências terríveis no ambiente e na sociedade. Suas causas compartilham erros, tais como as escolhas das técnicas de exploração do ambiente. Nesta obra, a partir da perspectiva da compositora, são apresentadas visões de “cenas auditivas” e alguns processos que culminam em dois dos piores desastres ambientais da história do Brasil. Foram usadas sonoridades que serviram de metáforas e símbolos para os contextos e ações ocorridas naqueles locais. A organização temporal da obra não retrata nenhuma exatidão dos fatos, pois se trata de uma abordagem da compositora de tais acontecimentos.

“Natural Mutations” (2020) de Tania Rubio

“Natural Mutations”. Obra acusmática multicanal que trabaja los procesos de transformación sonora de los cantos de las aves, en donde los sonidos fueron transformados hasta perder casi por completo la fuente de origen. La idea es crear nuevas entidades sónicas con una identidad propia que contengan ciertas características acústicas concernientes a la morfología del canto de las aves. La pieza es una construcción de paisajes sonoros imaginarios basados en la organización estructural del sonido presente en el fenómeno acústico de los coros del amanecer de las aves y anfibios. Para la elaboración de la obra hice una selección de la biofonıá de vocalizaciones de aves de la península de Yucatán, México. Utilicé algunos cantos de aves del disco Bird songs of México: Yucatan Peninsula Vol.1, realizado por A. Celis, F. González y D. Meltzer. Dichas aves fueron seleccionadas por ser parte de una región megadiversa con ecosistemas amenazados por los diversos procesos de urbanización. Frente a la crisis ecológica global que nos precede, considero el arte una herramienta estética para indagar y cuestionar el papel que juega el ser humano en relación con los demás organismos vivos que habitan el planeta. Presento la obra como una metáfora de paisajes sonoros imaginarios donde el ser humano es capaz de coexistir y cohabitar con las demás especies y con las nuevas tecnologías sin devastar a la naturaleza.

“Outuno” (2020) de Clayton Rosa Mamedes

“Outono” (2020). O projeto da obra surgiu de uma reflexão sobre as mudanças climáticas observadas pelo compositor durante o verão e o outono de 2019-2020. Este período temporal foi caracterizado pela confusão entre as expectativas que definem o clima de cada estação e as condições climáticas efetivamente vivenciadas. A obra reflete o sentimento de urgência para a luta em defesa do ambiente. É necessário confrontar, incessantemente, pontos de vista imediatistas e investigar novas formas de demonstrar o caminho insustentável que estamos a trilhar. Este conflito serve de base a um discurso poético que se inspira nas evidências de que rumamos a um destino sombrio. A obra emprega amostras sonoras obtidas junto aos acervos públicos da BBC e do Freesound.

“grés de Furnas” (2020) de Felipe de Almeida Ribeiro

“grés de Furnas” (2020) Terceiro movimento do ciclo composicional “Furnas”, esta obra tem como impulso criativo a experiência vivida pelo compositor de imersão espacial-física e espiritual nas Furnas de Vila Velha, Paraná, Brasil. A obra se concentra no micromundo deste ecossistema, amplificado pelas imagens sonoras das formações rochosas, dos diferentes grãos de arenitos da região, do acúmulo de líquidos entre outros elementos presentes. O intuito é de proporcionar um mundo de ressonâncias para o ouvinte, que é convidado a explorar uma paisagem de complexidades sonoras. Por outro lado, a peça faz uso exclusivo de sons de violão, estranhos à natureza do local e oriundos de um extenso acervo de amostras gravadas pelo próprio compositor. A ideia foi de trazer a interferência humana, na artificialidade atingida com a madeira processada, e devolver algo que originalmente pertencera à natureza. Nesse sentido, busca-se criar um instrumento acusmático de [re]conexão entre a natureza e o humano / artificial.

“Vida” (2020) de Patricia Martínez

“Vida” (2020) nace de una propuesta que agradezco muy especialmente, de repensar la actualidad y la composición musical, en términos extensivos al medio ambiente y la naturaleza, al impacto del ser humano en el planeta y el post-humanismo, para un proyecto de investigación del CD do Grupo de Pesquisa Núcleo Música Nova. Esta obra, intentará reflexionar sobre la temática propuesta, desde un lugar absolutamente espiritual: desde el amor puro e incondicional de mi relación con los animales, y especialmente con Noni, el ser que me acompañó los últimos 18 años. Por otra parte, nuestro planeta, luego de sufrir grandes exterminios de animales y vegetación por intervención humana, actualmente, nos toca a lxs humaxs enfrentar una pandemia mundial en donde, al igual que la naturaleza en otras circunstancias, no tenemos herramientas de defensa, más que el resguardo y la solidaridad. Un momento único, una oportunidad para intentar, como humanidad, replantearnos cómo es el lugar y la vida que queremos, para nosotrxs y para todos los seres vivos, además de la posibilidad de vincularnos desde el amor, respeto y comprensión con el resto de la naturaleza.

“Crise de Sol” (2020) de Paulo Rios Filho

“Crise de Sol” (2020). Fim do mundo, sempre houve pro sertão. Crise de sol, que é também crise de água, muito anterior às guerras por água, mas ainda assim com muita morte ao redor - planta, animal e gente; sempre contemporânea de sua comercialização e barganha - política, pública, privada. Lança a busca por novos mundos, tanto na terra quanto no céu. Por um lado, êxodo rural do corpo, por outro, religação de fé rústica. Calhas, cisternas, microclimas de vegetação, reflorestamento de caatingas: existem também, é preciso dizer, aqueles que buscam outras realidades possíveis em seu próprio mundo. Água, sol, chuva e seca são elementos que marcam as falas de Expedito, Bernadete, Teresinha, Lauro e Jaci, senhoras e senhores que vivem toda a vida da terra, da agricultura e da criação de animais. Conheço os três primeiros desde minha infância, no sertão da Bahia. Os dois últimos me foram apresentados na derradeira vez em que estive por lá, na terra em que cresci, antes de me mudar para outra região do país - onde só mais recentemente tem se conhecido a força negativa das estiagens prolongadas. Essa minha visita marcou também o período imediatamente anterior a uma paisagem global sem humanos, onde alguns estranhamente celebrariam a incomparável limpidez e o retorno de peixinhos a grandes canais de água, algures. Mas, na minha terra, a simples existência de aquíferos já seria um luxo. O mundo vai virar sertão? E o sertão vai virar mundo?

O projeto “Caravana da Síntese Sonora” apresenta os resultados parciais de pesquisas financiadas pelo CNPq Universal – 409750/2021-2 –  e pela FUNDAÇÃO ARAUCÁRIA – Programa Pesquisa Básica e Aplicada – PBA2022011000231.

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